FAKE NEWS: o ódio que mata

Você sabia que a mentira destrói vidas? Estamos vivendo em uma pandemia de fake news. Uma notícia falsa pode interferir tanto em decisões políticas quanto na vida de pessoas comuns, como no caso de Fabiane de Jesus: Ela foi linchada em praça pública após ter sido acusada nas redes sociais de sequestrar e fazer magia negra com crianças em Guarujá. Só tem um detalhe: ela era inocente.

     Conheça as histórias de Gabriel Dias e Sarah Monteiro. Ambos foram vítimas de fake news e relatam as consequências devastadoras do ódio que uma fake news pode gerar.

GABRIEL DIAS

“Se eu fosse achar uma palavra pra definir o que foi, foi isso: Aterrorizante” 

Era um dia comum como qualquer outro. Gabriel Baptista Dias, 17, estava seguindo com sua rotina de trabalho. “Com a correria, acabou que nem fiquei ligado nas redes sociais. Cheguei em casa, tomei meu banho e aí peguei meu telefone.”

    O jovem se deparou com milhares de mensagens de amigos e conhecidos de toda a cidade. As mensagens tratavam do mesmo assunto: uma lista com 63 nomes, incluindo o de Gabriel, divulgada na internet. Todos os listados eram homens, supostamente agressores e estupradores da cidade de Cuiabá. 

    “No começo, eu não liguei muito, mas depois que foi se espalhando muito rápido por Cuiabá, Mato Grosso, aí eu comecei a ficar preocupado.”  

    As mensagens não paravam de chegar. Eram de pessoas conhecidas e desconhecidas que, guiadas pelo instinto, começavam a aterrorizar Gabriel com diversos discursos de ódio. “Comecei a receber ameaças e logo já vem o desespero junto.” 

    Gabriel nunca tinha recebido mensagens de ódio daquele nível. De todas elas, recordou de uma que diz ter sido a pior que recebeu: “Falou que ia atrás de mim, que sabia onde eu morava, entendeu? E que não ia ter vez pra mim, que ele ia me pegar e que ia me bater e me apagar.” A família de Gabriel também foi alvo de calúnias: “desejaram o mal pra minha família”. 

    Houve momentos em que ele não sabia o que fazer. Tinha medo de sair de casa e limitou sua participação até nas redes sociais. “Você não sabe, se uma pessoa dessas te encontra na rua, o que ela vai fazer com você. Se ela vai vir te agredir ou se ela vai vir te ofender.” Ser acusado de um crime que ele nunca seria capaz de cometer foi o fato que mais o afetou. “As pessoas que não te conhecem acham que você é assim!” afirmou.

Ouça o áudio abaixo e entenda a relação entre ódio e fake news

A situação chegou a um ponto que Gabriel teve de reagir. Então, conversou com sua mãe, que é advogada, para saber o que fazer. O apoio da mãe foi essencial para enfrentar a situação. De acordo com Gabriel foi ela quem passou toda a sensação de calma. “Minha mãe é muito parceira minha”. 

    Os dois chegaram à conclusão de que o melhor a fazer seria um Boletim de Ocorrência. Foram até uma delegacia de Crimes virtuais e chegando lá, o jovem contou tudo o que aconteceu para o escrivão seguindo as orientações previamente dadas pela mãe. O B.O. foi emitido na mesma hora. Gabriel não relatou nenhuma dificuldade para a realização do procedimento.

    Com o B.O. em mãos, o próximo passo seria contar às pessoas que tudo era mentira. Então, Gabriel tirou fotos do Boletim de Ocorrência e publicou em seu perfil no Facebook pedindo para que as pessoas compartilhassem a verdade.

Fonte: Acervo pessoal

A partir de sua publicação no Facebook, duas garotas vieram conversar com Gabriel dizendo serem as autoras da lista divulgada. Além de desculpas pediram a ele para que retirasse o Boletim pois elas apagariam a lista. Porém, Gabriel se recusou a retirar o B.O., afinal o estrago já havia sido feito.

    As duas moças nem conheciam Gabriel. Disseram que alguém havia pedido para colocar o nome dele na lista. “Depois eu fui conversar com a pessoa. Perguntar por que ela fez isso. Se eu já tinha feito algum mal a ela.” Após um diálogo a situação foi resolvida, mas Gabriel não manteve contato com o culpado.

    Após isso, as duas garotas publicaram em suas redes sociais esclarecendo a situação e pedindo desculpas a todos os 63 rapazes que foram incluídos na lista.

    Hoje, Gabriel tem 18 anos e gerencia o próprio negócio, um PUB em Natal, no Rio Grande do Norte. Ele diz não ter mais medo da situação, já que tudo foi esclarecido, mas não deseja a ninguém o que aconteceu com ele.

Fake News

“Uma fake news pode acabar com a imagem de uma empresa, pode difamar a imagem de uma celebridade, ou de pessoas comuns mesmo, então a gente vê muitos casos de perseguição, de difamação e de ofensa, principalmente nas redes sociais, mas que isso também pode refletir na vida física, na vida real.

define Karine Batisda, fundadora da 2Bpress Assessoria de Imprensa e Comunicação, a respeito do fenômeno das fake news.

Calúnia, mentira, rumor, boato, etc. Independente do nome, as fake news sempre estiveram presentes na sociedade. Desde os primeiros historiadores atenienses manipulando a narrativa a seu favor, passando pelo imperador Septímo falsamente se declarando irmão de seu antecessor, até a criação de falsos inimigos pelos EUA na guerra do Vietnã.

    A diferença deste fenômeno atualmente, é a tecnologia, mais especificamente a internet. O poder de compartilhar uma informação, hoje não está mais restrito apenas à mídia, mas a qualquer um que tenha acesso a um celular.

Para entender como o mundo chegou no ponto atual, é preciso voltar para as eleições norte-americanas de 2016. A campanha de Donald Trump não apenas focou no mundo digital, ainda pouco explorado por seus adversários, mas também se utilizou de falhas das redes sociais. Tendo o Facebook como principal arma, o candidato republicano conseguia direcionar, para cada eleitor, uma narrativa específica (em sua maioria, mentiras) para manipulá-lo. Desta forma, Trump tornou-se para seus seguidores, uma espécie de detentor único da verdade, podendo desacreditar qualquer um que tentasse contradizê-lo.

Avançando dois anos, chegamos a 2018. Mais uma eleição, mas desta vez no Brasil. Jair Bolsonaro se elegeu seguindo as mesmas estratégias criadas por Steve Bannon (responsável pela campanha eleitoral de Donald Trump) em 2016. Bolsonaro seguiu todas as estratégias estabelecidas pelo presidente norte-americano, mas com uma nova arma à disposição, o Whatsapp.

    Segundo uma pesquisa do Instituto DataSenado, 64% dos entrevistados afirmaram que sempre utilizam  o aplicativo de mensagens como fonte de informação, outros 24% dizem usar “às vezes”. O Facebook, antes visto como principal ferramenta, aparece apenas com metade do números do Whatsapp .

4 anos após sua eleição, em 2020, Donald Trump disputava sua reeleição, novamente utilizando suas estratégias já conhecidas : negar e atacar todos aqueles que ousassem desafiá-lo. No entanto, nesse período, diversos escândalos envolvendo empresas que diretamente (ou indiretamente) ajudaram Trump a se eleger para seu primeiro mandato. Entre os mais notórios, aparecem o Facebook e a Cambridge Analytica.

A Cambridge Analytica era a responsável por, mesmo que de forma ilegal, coletar dados, analisá-los e traçar perfis para os usuários do Facebook. Essas informações foram usadas não apenas por Trump em sua campanha, mas também para garantir a saída do Reino Unido da União Europeia (Brexit em 2016).

“Tem muita fake news, muita notícia falsa, que quando ela é publicada, impulsionada, direcionada, ela ataca aquele público alvo, no filme “Privacidade Hackeada”, a Rússia, ao utilizar as fake news, ela atinge aqueles indecisos ou quem votará na oposição. Como eles sabiam quem seriam essas pessoas ? Com coleta de dados. E como coletar esse dados ? Muitas vezes é pela internet e pelas redes sociais.”

afirma Luiz Augusto, advogado em crimes cibernéticos e Presidente da Comissão Nacional de Cibercrimes da ABRACRIM.

Sem sua principal arma, o então presidente dos Estados Unidos falhou em se reeleger. Mas o estrago já estava feito : a partir dessa estratégia de manipulação, Trump criou uma legião de conspiracionistas mundo afora. Mesmo sem seu tutor, muitos políticos e influenciadores ainda surfam na onda das fake news.

 Ainda hoje, as notícias falsas ainda são muito efetivas, se espalhando 70% mais rápido que uma verdadeira, e se tratando de política, é ainda três vezes mais veloz, de acordo com pesquisa realizada pelo MIT.

Segundo Karine, as fake news ainda hoje contam com um poder enorme por seu fator chamativo : “Essas notícias normalmente são mais atrativas do ponto de vista de despertar na pessoa aquela vontade de falar. ‘Ah meu deus, isso aqui eu preciso compartilhar’. Normalmente tem um caráter sensacionalista.”

Para mais informações, acesso o site: https://odioefakenews.wixsite.com/


As notícias publicadas no Canal FAPCOM, tem como objetivo atender o artigo X da Diretriz Curricular Nacional do Curso de Jornalismo, publicada em 27 de setembro de 2013. Ela contempla o artigo 6º., inciso VI, que determina que o projeto pedagógico deve conter conteúdos que atendem ao eixo de prática laboratorial para propiciar conhecimentos e “desenvolver habilidades inerentes à profissão”.


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